Nobody, no original – que significa ninguém – talvez tenha mais impacto que anônimo; pois, às vezes quando respondemos com “ninguém” não significa literalmente a palavra e, sim, que não queremos dizer o nome, por diversos motivos.
E esse é o caso de Hutch Mansell; hoje, um homem de família, dedicado ao trabalho, que nunca leva o lixo a tempo do caminhão pegá-lo e vive uma guerra silenciosa com a mulher, Becca, interpretada por Connie Nielsen.
Hutch trabalha numa empresa de construção civil, com o sogro, Eddie – interpretado por um envelhecido e flácido Michael Ironside e o cunhado, Charlie – papel de Billy McLellan. Hutch tem interesse em comprar a empresa da família e a impressão que temos é que ele tem a necessidade de ter algo seu. Porque a casa não parece ser sua, ele vai ao trabalho de ônibus e vive uma relativa vida distanciada dos filhos; não muito. Com Becca, o abismo é gigantesco. Ambos estão no mesmo cenário, mas parecem não querer estar.
Tudo começa a mudar quando, na madrugada, Hutch ouve barulho na garagem; ele vai ao quartos dos filhos e percebe que o filho também ouviu. Quando chega na porta da frente, um casal de invasores o aborda. Eles querem dinheiro, mas o que ele tem são trocados e explica que faz uso apenas de cartão.
Enquanto Hutch discute com a invasora, o marido dela sobe e o filho de Hutch, Blake, se engalfinha com o ladrão. Hutch tem a chance de neutralizá-los mas não o faz. Blake ainda ganha um olho roxo quando o ladrão se despede.
Embora pareça tranqüilo, Hutch está em ebulição.
Falta apenas um pequeno empurrão para que todo o castelo de cartas da passividade que ele criou vá por água abaixo. E isso acontece quando sua filha vai procurar a coleira da gata, que estava no pote junto com o dinheiro que o casal levou. Era o que faltava!
Hutch vai até ao asilo onde o pai está morando, pega um revólver e sai de estabelecimento de tattoo em estabelecimento de tattoo procurando uma que ele viu no antebraço da mulher.
Com a informação, Hutch vai até à casa do casal, os ameraça um pouco, mas quando vê a situação deles, desiste.
Mas Hutch ainda está em ebulição.
E alguns novos passageiros do ônibus que ele pegue lhe garantem essa detonação. Claro, os arruaceiros estão com a palavra “espanque-me” em suas testas; ainda mais quando começam a assediar a única mulher – fora a motorista do coletivo – do ônibus. Hutch tem a absoluta certeza de que estravazar seja a única solução para voltar para casa e dormir. E ele o faz.
E a briga se mostra bem feroz.
Hutch realmente faz um estrago.
E esse estrago, geralmente, gera consequências, como diria outro casca-grossa, John Wick – ambos os filmes compartilham do mesmo roteirista.
Um dos arruaceiros é irmão mais novo de um russo, membro de uma máfia assassina e canta na própria boate enquanto lava o dinheiro da organização comprando obras de arte. Para você ter uma idéia do estilo do bandido, ele veste um terno prata.
Yulian, papel do russo, Aleksey Serebryakov, é tão brutal e pinel quanto qualquer outro vilão mortífero. Para você ter uma idéia, quando vai visitar o irmão no hospital, ele dá cadeiradas no colega dele por não tê-lo protegido.
Agora, a caçada vai começar.
Sim, Hutch foi descuidado e deixou cair o seu cartão-passagem e agora pode ser rastreado.
E sua família? Ninguém sabe nada sobre essa outra vida que aparentemente ele havia enterrado.
A briga foi boa para Hutch, inclusive para se reaproximar de Becca, pois ela lhe faz curativos e aparentemente uma trégua entre eles se manifesta.
Mas, através de intermediários Hutch descobre quem está dele e sabe que não dá para brincar muito com isso; enquanto tentam saborear o jantar, a família percebe que tem visitas: Hutch tranca a todos num porão – que mais parece um bunker.
Ele trucida a todos, mas é levado. Foge, liberta a família e os manda para longe.
Assim, não terá possíveis vítimas de seqüestro e assim por diante.
Hutch resolve ir até Yulian.
Se você quer um filme de ação e tiroteios, com explosões e testosterona, esse é o filme. Confesso que o trailer de Anônimo me pegou desde o início. Reconheci o protagonista,
Bob Odenkirk – de Better Call Saul – mas ali eu não sentia muita firmeza nele; parecia um peixe fora d’agua.
Assistindo ao filme, continuei com essa sensação.
Lembrei das antigas revistas SET, numa delas que falava de um filme chamado Além das Linhas Inimigas, um filme de ação estrelado por Owen Wilson e destacava estrelas que se arriscaram em filmes de ação mesmo após uma carreira longe do gênero. O título era “Esses se deram bem fazendo filmes de ação: Tom Cruise, Brad Pitt, Keanu Reeves— e esses: Charlie Sheen, Cindy Crawford, Sandra Bullock, nem tanto”.
Vejo Odenkirk na segunda prateleira. Legal, se arriscou a segurar um filme de ação, mas parece não ter o punch que o personagem precisa.
Pensei em Ethan Hawke. Seria um papel sob medida para ele.
Mas— lendo uma entrevista com o diretor, Ilya Naishuller, descobri que o filme só existe por causa de eu astro: foi Bob quem teve a primeira idéia para a história.
\”O interessante é que esse projeto veio do Bob. Foi sua experiência pessoal que o fez pensar sobre esse personagem cuja casa é invadida e ele não faz nada sobre isso\”, explicou Naishuller em entrevista por telefone ao Geek Culture.
\”E então os policiais vêm e dizem \’Você fez a coisa certa.\’. E então ele pensou: \’Bem, e se eu fosse um [cara] durão? E se eu pudesse ter parado o intruso? E então, eu não fiz.’
Então, sem Bob, sem filme.
Connie Nielsen interpreta Becca, a esposa de Hutch; porém, em dado momento, você pergunta: o que uma atriz do calibre dela está fazendo ali? Porque ela não tem história, não tem sequer uma subtrama; não há desenvolvimento de personagem. Nielsen já havia interpretado a “esposa” de um matador antes, em 3 Dias para Matar, mas há uma diferença gigantesca entre aquele personagem para esse. No trailer, eu acreditei que ela estivesse em cena porque possivelmente seria o nome chamariz do filme; após assisti-lo, não: infelizmente ela aceitou o papel para não ficar desempregada, só pode ser essa a resposta. Nielsen peitou John Travolta em Violação de Conduta como uma militar linha dura; fez o déspota Comoddus, de Joaquin Phoenix, ter sonhos tórridos de incesto em Gladiador e tentou levar Keanu Reeves ao mal caminho em Advogado do Diabo. Além de ser a mãe da Mulher-Maravilha. Não é pouca coisa.
Enfim, Anônimo tem uma trama interessante, explosões a rodo e certa pitada de bom-humor, mas falta carisma de um astro para segurar uma franquia – tal qual Keanu Reeves e John Wick. Quer desligar o cérebro e curtir? Bora!
Mas não espere um John Wick 4.
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