Neto de um português analfabeto; filho de um homem que botava paletó para ouvir notícias no rádio, Ariclenes Venâncio Martins, completou 90 anos no antepenúltimo dia de março de 2020.
Mineiro, de Desemboque, ele chegou a São Paulo, para ser radialista, aos 18 anos, a bordo de um caminhão de mangas.
Lima, que ainda não era Lima, e sim um anônimo Ariclenes, tentou ser radialista; porém, foi rejeitado de início, porque a voz não ajudava – ele ficou conhecido como “Voz de Sovaco”. Virou contra-regra, sonoplasta e o que mais fosse possível, até conseguir um emprego na Rádio por pena.
Porém, Ariclenes não se deu por vencido e uma oportunidade de sua voz ser ouvida apareceu, quando foi necessário uma fala de um personagem qualquer.
Assim, começou a trajetória daquele que se tornaria o maior ator da tv brasileira e o que melhor encarnou o brasileiro.
Lima esteve na inauguração da TV Tupi, do lendário Assis Chateubriant; após 27 anos ali, partiu para a Globo e, claro, graças à tecnologia e passagem do tempo, ficou bastante conhecido.
Primeiro como diretor – dirigiu Beto Rockfeller, e o maior sucesso da tv de todos os tempos: O Direito de Nascer.
Depois, como ator, ao interpretar Zeca Diabo em O Bem Amado; Sinhozinho Malta em Roque Santeiro e Sassá Mutema, como o Salvador da Pátria.
Dali em diante, Lima tornou-se um ícone, com trejeitos originais, ora como vilões, ora como heróis.
Lima foi de tudo um pouco, turco, árabe, português, gaúcho, judeu, inclusive Deus, no especial O Santo que Não Acreditava em Deus, de João Ubaldo Ribeiro.
Foi também dublador; dublou os personagens-título Wally Gator e Pepe Legal, desenhos animados da Hanna Barbera.
Lima apresentou, durante muito tempo, o Som Brasil, programa que mostrava justamente o campo, o verde, com artistas que cantavam o sertanejo.
Lima nunca escondeu o lado sertanejo e talvez por isso tenha ficado marcado pelos personagens Zeca Diabo e Sassá Mutema; adora contar causos, histórias, sempre com sensibilidade e emoção.
A primeira vez que vi Lima em ação foi em Roque Santeiro – ele interpretava Sinhozinho Malta, um matuto que se tornou deputado e graças a uma mentira, se tornou o dono da cidade. Depois, como Sassá Mutema, outro matuto em O Salvador da Pátria; cujo enredo é muitíssimo interessante.
Porém, em 1992, Lima foi o astro de uma novela: Murilo Pontes, em Pedra Sobre Pedra. Lembra da música Entre a Serpente E A Estrela, de Zé Ramalho? Ficou famosa ali.
Quatro anos depois, ele retomou o personagem, numa participação especial em A Indomada.
Em 2000, dois filmes bastante interessantes: O Auto da Compadecida; difícil escolher quem está melhor ali, um elenco afiado, bem-humorado e sinérgico; e Eu Tu Eles, que Lima carrega nas costas. Nem mesmo Stênio Garcia consegue se equiparar ao velho Ariclenes no talento.
Hoje, Lima está relegado ao coadjuvantismo, muito provavelmente pela passagem do tempo – talvez seu último papel de destaque tenha sido em Araguaia.
De qualquer maneira, nunca houve alguém como Lima Duarte, nem haverá. E que mesmo aos 90, ele possa voltar a abrilhantar os nossos dias com novas interpretações.
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