OLDBOY – DIAS DE VINGANÇA [2013]
Direção: Spike Lee
Com: Josh Brolin; Elizabeth Olsen; Samuel L. Jackson e Sharlto Copley.
Conheci Oldboy através do mangá, escrito por Garon Tsuchiya e ilustrado por Nobuaki Minegishi. São 78 capitulos que contam a história de Shinichi Goto, um homem comum que ficou preso numa espécie de quitinete por dez anos, recebendo comida chinesa e mantendo contato com o mundo exterior apenas por uma tv. Quando sai, Goto tenta descobrir porque foi preso e, por quem. É uma história muito bonita e chega a ser edificante, uma vez que Goto nunca se deixa levar pela raiva. Com o passar do tempo, ele percebe que precisa manter a lucidez e, para isso, começa a fazer exercícios físicos e treina artes marciais através de filmes que passam na tv.
Em 2003, o diretor coreano Park Chan-wook desenvolveu uma adaptação para os cinemas, como o capítulo do meio de sua trilogia da Vingança.
No filme, Oh Dae-su, um homem comum – porém, que gosta de abusar da marvada de vez em quando – vai preso por criar confusão no dia do aniversário de quatro anos de sua filha. Ao sair da cadeia, ele usa um orelhão para telefonar à família e sai caminhando. Oh Dae-su acorda, um tempo depois, preso, numa espécie de quitinete, exatamente como no mangá. A diferença é que ele fica encarcerado por mais tempo: 15 anos.
Claro que embora tenham uma espinha dorsal parecida, as tramas são tão distintas quanto suas plataformas.
Se no mangá, Goto é um cara contemplativo – e por isso, pensa antes de dar qualquer passo – Oh Dae-su é mais impulsivo – a histórica cena do martelo, que ganhou uma “homenagem” na série do Demolidor, feita em apenas um take está aí para provar o meu ponto.
E, claro, as motivações do vilão também mudam, assim como a recompensa e as conseqüências. Nesse caso, o mangá termina de uma forma muito mais satisfatória para seu protagonista.
Mas não há é dessas produções que eu vou falar, mas sim da versão estadunidense, feita dez anos após a coreana e baseada em sua maioria nesta.
Oldboy ocidental começou a dar os primeiros sinais de vida em 2005, quando todos os boatos indicavam para um nome: Justin Lin – diretor de Velozes e Furiosos 3 e Annapolis, na época.
Nicolas Cage supostamente seria a estrela a ser enclausurada por vários anos e depois buscaria a vingança. Aliás, mais do que isso: quando soube que a Universal havia adquirido os direitos da refilmagem, Cage se mostrou oficialmente interessado em levar o projeto adiante. Depois, Russell Crowe entrou na briga.
Quando Lin – que escreveria e dirigiria – deixou a produção, o nome do quente do momento [na verdade, dois nomes quentes] atendia por Steven Spielberg. Sim, Spielberg quase dirigiu Oldboy. E trouxe Will Smith consigo. Que, por sua vez, convidou Mark Protosevich para reescrever o roteiro – uma vez que o produtor Roy Lee descartou a versão escrita por Lin.
Protosevich, que havia trabalhado com Smith em Eu Sou a Lenda foi o único nome que ficou; pois os executivos gostaram bastante de sua versão. Aliás, ele se manteve como roteirista único desde o início e fez inclusive um acordo por isso.
Então, o filme que você vê é o filme escrito por ele.
Não demorou muito para Smith e Spelberg saírem da produção, que rodou por um par de anos até encontrar o seu protagonista: Josh Brolin. Depois, veio Spike Lee, talvez o nome mais controverso da produção.
Spike, porém, explica o porquê de estar ali: porque adorou o mangá; porque poderia inserir ingredientes do mangá no novo filme que a versão coreana não tem. Aliás, o único pedido feito por Park Chan-wook foi que eles não copiassem o seu filme. E assim foi feito. Em parte.
Para os papeis coadjuvantes, foram convidados Collin Firth – como o vilão – e Rooney Mara – a protagonista feminina. Ambos acabaram nas mãos de Sharlto Copley – de Esquadrão Classe A – e Elizabeth Olsen – a Wanda, de Wandavision – respectivamente. Olsen faz um grande trabalho como Marie Sebastien, uma assistente social, aparentemente adepta do sebastianismo do século XXI, que decide ajudar o personagem de Brolin quando este sai de seu hiato na quitinete.
Mas vamos lá, vamos falar de Oldboy americanizado. Aqui, nós conhecemos Joe Doucett, um egocêntrico publicitário, viciado em três coisas: sexo fácil, bebida e vendas. De início, seu chefe deixa bem claro que o próximo jantar com um potencial cliente precisa ser perfeito; ou ele – Doucett – estará arruinado. Porém, para um homem que vira suas noites na gandaia e vai trabalhar sob efeito de álcool e chega ao escritório cantando a própria secretária, o termo arruinado tem outro significado.
No jantar, é óbvio que Joe fará um belo estrago, porque ele já dá mostras de que não suportará essa vida por muito tempo. Ele já foi casado e tem uma filha de três, que provavelmente não vê há quatro! E quando a ex liga, ele já sabe que esqueceu de pagar a pensão. Sobre a menina, nem uma pergunta sequer.
Sim, Joe não vale nada. E o roteiro de Protosevich deixa isso bem claro. Então, se desaparecer por um bom par de anos, que diferença vai fazer? Só que ele desaparece por VINTE anos.
Então, nossa história começa em 1993. Para você ter uma idéia, a Seleção Brasileira era tricampeã mundial na época.
A princípio, Joe pensa que está num quarto de motel, com uma mulher que lhe deu bola no restaurante, enquanto ele tentava arruinar ainda mais a própria vida. Depois, descobre que está preso mesmo, pois percebe que há um papel de parede na porta, que aparentemente era de madeira, mas não, é de aço mesmo.
Com o passar do tempo, Joe tenta se comunicar com quem lhe joga comida – chinesa – por uma portinhola na parte de baixo da porta, tenta usar o interfone, mas nada resolve.
Toda vez que chega comida, Joe recebe também uma garrafa de vodca.
Com o passar do tempo, assim como suas contrapartes das outras produções, Joe cria um vínculo com a tv e passa a receber notícias do mundo lá fora através do aparelho. Pela tv, ele fica sabendo que sua ex-mulher foi estuprada e violentamente assassinada por ele, Joe. E sua filha, Mia, fora adotada.
Joe começa a retomar o controle de seus atos e o remorso por não ter sido um pai melhor começa a lhe nocautear.
Com o passar do tempo, Joe vai jogando fora as garrafas de vodca que recebe e após uma imensa batalha, começa a comer a comida chinesa.
Sempre que há necessidade, o quarto é inundado de gás, fazendo-o dormir. Na primeira vez, acontece quando ele se empolga com um exercício que uma mulher está fazendo na tv e acaba por se masturbar.
Enquanto está desacordado, Joe tem seu dna colhido por seus captores.
Na segunda, quando ele quebra o espelho e tenta se suicidar.
E na última, quando será finalmente solto.
Através da tv, Joe descobre sobre sua filha, pois um programa bem ao estilo Brasil Urgente frequentemente investiga o misterioso desaparecimento do homem que matou a ex-esposa e deixou a filha para ser adotada. Ali, Joe conhece a família que adotou sua filha e que não contou a ela sobre a tragédia que seus pais biológicos viveram.
Joe então, numa tentativa de se redimir, escreve diversas cartas à filha, pedindo-lhe perdão e prometendo ser um pai de verdade quando dali saísse.
Chega o momento e, assim como chegou, Joe também sai. Com uma quantia substancial no bolso, ele consegue sair de sua última prisão: um baú bem grande.
Ao sair, ele vê uma mulher se distanciando e põe-se a persegui-la quando é interceptado por jovens que treinam futebol americano num campo. Joe bate muito neles e as cenas de luta são muito bem-feitas. Joe está sempre furioso enquanto briga e isso bem claro nas coreografias. Após trucidar os rapazes, Joe segue atrás da mulher – que, claro, desaparece.
Assim como nas outras contrapartes, Joe também encontrou no exercício físico e treinamentos de artes marciais o consolo perfeito para fugir da loucura. E ele briga com muita vontade.
Uma vez fora, Joe então tenta encontrar a filha e descobrir quem o prendeu e porquê.
A espinha-dorsal de todos os Oldboys é a mesma; nada muda. Nessa versão, vemos algumas nuances do mangá e piscadelas para o filme coreano.
Elizabeth Olsen entra em cena para ajuda-lo, uma vez que Joe está sempre encrencado; ela é assistente social, mas cuida de desabrigados, por isso entende alguma coisa de saúde também. Acredito que o encontro entre eles é interessante, mas a motivação dela para ajudá-lo é bastante rasa.
Enfim, Joe consegue voltar ao prédio onde estava preso e, muito provavelmente, veremos a cena da briga. E há. Mas, confesso que prefiro a versão coreana.
Embora Roy Lee tenha prometido que Spike Lee dirigisse a cena de uma forma nunca antes vista, não é o que vemos na tela e, inclusive, a versão do Demolidor é superior a essa.
Joe vai atrás do único amigo que acredita ter para tentar ajudá-lo a descobrir quem o trancafiou e porquê – e descobrimos que eles inclusive estudaram juntos.
Então, o arquiteto dos problemas de Joe aparece na pele de Sharlto Copley, que lhe faz uma proposta: dizer quem é ele e porque ele o trancou por 20 anos; porém, ele tem apenas 46 horas para isso. Ou Mia morrerá.
Josh Brolin talvez seja um grande ator, está sempre envolvido nas maiores produções de Hollywood, mas eu não consigo vê-lo como um cara que fica preso por 20 anos. Nas cenas de luta, ele transparece estar furioso, mas só.
Ele não tem o perfil que o papel exige.
Christian Bale poderia ser uma opção mais interessante.
Claro que, talvez, de todos candidatos anteriores, Brolin tenha sido o melhor – é impossível ver Will Smith ali, ainda mais com direção de Steven Spielberg; ele transformaria um filme impactante em um drama familiar. Nicolas Cage também não dá. Talvez Russell Crowe. Talvez Jammie Foxx. Com certeza, Mahershalla Ali. Mas, quem era Ali em 2013?
Spike Lee mostra como é excelente diretor de atores; faz um trabalho formidável com Elizabeth Olsen – que noutras produções parece ser mais do mesmo; aqui, ela mergulha na personagem.
Sharlto Copley aparentemente é um ator de método; ou seja, não sai do personagem nem mesmo quando vai ao banheiro; numa entrevista, Spike Lee dá muitas risadas quando fala do ator.
E o final? É igual à versão coreana? Ao mangá?
Não.
O final é diferente e, diferentemente do que Roy Lee tenha declarado antes das filmagens, é o mais fraco dos três.
Faltou talvez coragem para ousar na cena final.
Oldboy – Dias de Vingança vale a pena? Por uma curiosidade, vale. Mas a versão coreana é muito superior.
Há cenas muito corajosas, como a morte da ex-mulher de Joe, há outras mais fabulosas quando percebemos que Marie não está ali apenas para ajudar um homem perdido; ainda mais quando sabemos que o vilão está vendo tudo. Mas ao final, a produção de Chan-wook se sai melhor.
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